Situação e futuro de Temer dividem os três maiores jornais do país
Congresso em Foco
20/5/2017 | Atualizado às 13:10
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José Cruz/ABr
As suspeitas contra o presidente Michel Temer levantadas pela delação de dirigentes do grupo JBS dividiram os três principais jornais do país. No editorial, aquela seção em que cada veículo expõe o que o seu comando pensa sobre grandes temas do momento, a Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo e O Globo assumem posições distintas em relação à gravidade das acusações, ao peso dos indícios e das provas apresentadas contra o presidente e ao futuro do governo Temer.
O jornal carioca, que revelou em primeira mão, na noite da quarta-feira (17), o teor dos depoimentos dos empresários Joesley e Wesley Batista, declarou guerra ao presidente e pediu sua renúncia imediata. O Estadão se entrincheira no lado oposto, defende a permanência de Temer, questiona os interesses por trás de uma eventual destituição de Temer e chama de "golpe" qualquer tentativa de se convocar uma eleição presidencial direta. Já a Folha adota um tom mais cauteloso. Cobra esclarecimentos dos personagens envolvidos e classifica como "inconclusivos" os diálogos e as denúncias contra o peemedebista.
Na parte noticiosa, os dois jornais de São Paulo publicaram neste sábado reportagens que questionam a autenticidade da gravação que compromete Temer. Peritos ouvidos pelos dois veículos apontam cortes no material, o que reforça a tese da defesa do presidente de que houve manipulação no conteúdo dos áudios.
Sem condição moralEm seu editorial, O Globo diz que apoiou e acreditou no "projeto reformista" de Temer desde o início de seu governo, logo após o afastamento da ex-presidente Dilma. "Mas a crença nesse projeto não pode levar ao autoengano, à cegueira, a virar as costas para a verdade. Não pode levar ao desrespeito a princípios morais e éticos", diz trecho do texto.
O jornal ataca o comportamento de Temer diante de Joesley Batista, no encontro ocorrido em março no Palácio do Jaburu, bem com o seu silêncio da confissão de crimes por parte do empresário. "Ao abrir as portas de sua casa ao empresário, o presidente abriu também as portas para a sua derrocada. E tornou verossímeis as delações da Odebrecht, divulgadas recentemente, e as de Joesley, que vieram agora a público", destaca.
"Nenhum cidadão, cônscio das obrigações da cidadania, pode deixar de reconhecer que o presidente perdeu as condições morais, éticas, políticas e administrativas para continuar governando o Brasil", acrescenta o editorial.
O Globo contesta o argumento de que a troca de governo traria ainda mais instabilidade política e econômica ao país. "A realidade não é aquilo que sonhamos, mas aquilo que vivemos. Fingir que o escândalo não passa de uma inocente conversa entre amigos, iludir-se achando que é melhor tapar o nariz e ver as reformas logo aprovadas, tomar o caminho hipócrita de que nada tão fora da rotina aconteceu não é uma opção", afirma o jornal. "Fazer isso, além de contribuir para a perpetuação de práticas que têm sido a desgraça do nosso país, não apressará o projeto de reformas de que o Brasil necessita desesperadamente. Será, isso sim, a razão para que ele seja mais uma vez postergado. Só um governo com condições morais e éticas pode levá-lo adiante", emenda.
Irresponsabilidade e oportunismo
Em linha oposta, posiciona-se o Estadão. O tradicional jornal paulista saiu, nos últimos dois dias, em defesa do presidente na seção em que expressa claramente suas posições. A direção do veículo alega que não há nada que implique Temer nas gravações feitas por Joesley Batista, condena os vazamentos da delação e responsabiliza o PT pelo "clima anuviado" que o país vive devido à "incessante campanha petista pela cisão dos brasileiros entre 'nós' e 'eles'".
Para o Estadão, este "grave momento da vida nacional" passará à história como aquele em que a irresponsabilidade e o oportunismo prevaleceram sobre o bom senso e sobre o interesse público. O jornal chama de "afoitos" os que defendem a destituição do presidente e os acusa de atentar contra a sociedade e a Constituição.
Mesmo sem citar o nome do concorrente, o Estadão questiona os interesses de procuradores "messiânicos" em vazar para O Globo o conteúdo da delação dos irmãos Batista. "O vazamento de parte da delação do empresário Joesley Batista para a imprensa não foi um acidente. Seguramente há, nos órgãos que têm acesso a esse tipo de documento, quem esteja interessado, sabe-se lá por quais razões, em gerar turbulência no governo exatamente no momento em que o presidente Michel Temer parecia ter arregimentado os votos suficientes para a difícil aprovação da reforma da Previdência."
O jornal também condena expressamente qualquer tentativa de mudar a Constituição para se convocar eleições diretas para a eventual necessidade de substituição do presidente. A solução, chamada de "esdrúxula" e "milagreira" pelo jornal, é tratada como um "golpe".
"Qualquer irresponsável que propuser ou defender uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altere os termos do artigo 81 e institua eleições diretas em caso de vacância da Presidência e da Vice-Presidência a menos de dois anos do término do mandato estará propondo, na verdade, um golpe à ordem constitucional. Estará propondo, em última análise, um golpe contra a sociedade que se organizou em torno da Carta Magna em vigor, por meio de representantes legitimamente eleitos para um dos mais altos desígnios em um regime democrático."
Provas inconclusivas
Já aFolha de S.Paulo considera "inconclusivas" as provas apresentadas até o momento pelos delatores da JBS contra o presidente e cobra esclarecimentos de Temer e dos demais acusados para que o país resgate a governabilidade. Para o jornal paulista, a divulgação das gravações revelou que o diálogo entre o presidente e o empresário não era tão comprometedor como se supunha inicialmente.
"Certamente confidencial e sibilina, a conversa não parece todavia constituir a devastadora peça de evidência que se imaginava inicialmente. 'Tem de manter isso, viu?', disse o presidente ao empresário, no que se interpretou como um beneplácito aos pagamentos destinados a Cunha. Ouvindo-se a gravação, as circunstâncias não se delineiam com tal clareza", afirma a Folha. "O dono da JBS afirmava 'estar de bem com o Eduardo', logo antes da frase pronunciada por Temer - a qual, em tese, pode tanto ser entendida apenas como um inócuo assentimento, eivado de cautela, quanto como a aprovação de alguma ilicitude sistemática", acrescenta.
Na avaliação do jornal, as consequências do caso dependem de "evidências complementares. "Decerto não convém a um mandatário ser flagrado em tratativas ambíguas com um empresário sob investigação -que chega a mencionar informações obtidas por meio de um procurador. Do ponto de vista jurídico, porém, o episódio resulta por enquanto inconclusivo, dependendo de evidências complementares." Para a Folha, o momento é de aprofundar as investigações e cobrar explicações. "Urge um esclarecimento mais célere dos fatos, por parte de todos os envolvidos, para que se equacione a crise de governabilidade em que mergulhou o país."
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