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Congresso em Foco
19/8/2020 | Atualizado 10/10/2021 às 17:33
Tais interpelações auto- e heterorreferenciadas de indivíduos como pertencentes a certa raça, definida em termos tanto biológicos como culturais, estão na base do racismo. Diferentemente de outros fenômenos de intolerância e xenofobia observados no passado, o fenômeno do racismo surge com o discurso da modernidade e do nacionalismo (Pinto; Mignolo, 2016).[i]
Em que pese a nem sempre se manifestar da mesma maneira nas diferentes práticas nacionalistas, o racismo é a condição determinante de sua produção. Na verdade, a relação entre nacionalismo e racismo é de mútua determinação. Os discursos nacionalistas e racistas estão intrinsecamente ligados, mas a relação entre nacionalismo e racismo não é de causalidade.
O racismo produz o ethnos fictício em torno do qual o discurso nacionalista é articulado. Esse ethnos fictício é produzido por movimentos nacionalistas por meio da exclusão do outro, que a seu turno é construído por intermédio da rearticulação das diferenças em uma cadeia de equivalências.
Essa cadeia de equivalências pode construir diferentes grupos étnicos como pertencentes a uma massa indistinta de pessoas consideradas inferiores devido à sua raça biológica. Mas o racismo também pode operar dentro de um sistema de diferenças por meio da associação de certas identidades étnicas com traços culturais construídos com sendo incompatíveis com os valores e as normas do ethnos predominante.
Tanto o racismo biológico como o cultural envolvem a estigmatização do outro. Isso se inscreve em práticas sociais de discriminação, intolerância, humilhação e eliminação, assim como em representações fantasiosas que invocam a necessidade de purificar o corpo social para preservar sua identidade e protegê-lo de toda forma de mistura, miscigenação e invasão.
Tais representações fantasiosas de racismo podem desenvolver-se espontaneamente como parte das práticas sociais ou podem ser resultado de doutrinas engenhosamente formuladas. A força dessas doutrinas reside no fato de que provêm chaves interpretativas a indivíduos em um mundo crescentemente dividido. Ou seja, funcionam como princípios hermenêuticos a permitir que as pessoas atribuam algum sentido a um mundo cada vez mais caótico e nele, de alguma forma, consigam se posicionar.
O perigo está em esse mito se transformar em um imaginário social a prover o horizonte último de sentido e ação. Em outras palavras, o perigo reside em o racismo deixar de ser apenas um entre vários para se tornar no único princípio hermenêutico capaz de revelar os segredos da ordem social e os inimigos que têm conspirado para privá-la de sua plenitude.
[i] Pinto, J. R. de S., & Mignolo, W. D. (2016). A modernidade é de fato universal? Reemergência, desocidentalização e opção decolonial. Civitas - Revista De Ciências Sociais, 15(3), 381-402. https://doi.org/10.15448/1984-7289.2015.3.20580.
*doutor em Sociologia pela UnB com pós-doutorado em Oxford e Duke, advogado e professor do Mestrado Profissional em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados, atualmente ministrando a disciplina “Teoria e análise do discurso”.
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