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Congresso em Foco
3/8/2016 | Atualizado 9/8/2016 às 14:01

Por volta das 16h30 do dia 26 de janeiro de 2013, a estudante Francielle Trindade Kittel, a Fran, de 26 anos, tirava a sesta com o engenheiro agrônomo Gomeri Pereira, seu companheiro há oito anos, quando o celular da garota começou a receber mensagens. Amigas a convidavam para visitar a Feovelha, feira agropecuária famosa na região, realizada todos os anos no município de Pinheiro Machado, a 80 quilômetros de Piratini. Mais do que negócios, na Feovelha ocorrem batizados, noivados, casamentos. É um evento de grande inserção social. Francielle e Gomeri, por exemplo, se conheceram na feira de 2005. Ela, natural de Bagé; ele, de Arroio Grande. Meses depois, foram viver juntos em Piratini, cidade que foi sede do governo na Revolução Farroupilha, na qual o Rio Grande do Sul se tornou independente do Império do Brasil por 10 anos (20 de setembro de 1835 a 1º de março de 1845).
Quarenta anos mais velho que Fran, Gomeri pagou os estudos de sua companheira no curso de Veterinária na Universidade Católica de Pelotas e decidiu bancar o segundo curso da garota, de Agronomia, na Universidade da Região da Campanha (Urcamp), em Bagé.
– Toco projetos agrícolas com bancos e convenci a Fran a se formar agrônoma para assumir os negócios comigo. Ela passou no vestibular e aluguei um apartamento pra ela morar e estudar em Bagé – relata.
No sábado, 26 de janeiro de 2013, já bem acordada da sesta com o companheiro, as amigas continuavam insistindo para que Fran fosse vê-las na Feovelha e depois, quem sabe, passar o domingo na praia do Cassino, no litoral do município de Rio Grande.
– Ela me mostrou as mensagens e me convidou. Mas eu estava cansado e disse pra ela ir sozinha – recorda Gomeri.
Minutos depois, Francielle se despediu de Gomeri e ligou o motor do Cherry cor de sangue. O carrinho, presente zero quilometro de seu parceiro, tinha dois meses de uso. Deu a partida e tomou a rodovia RS-702, que liga Piratini à BR-293. Minutos depois veio o acidente, na entrada da Ponte do Costa, mesmo nome do arroio sob esta passagem, a 15 quilômetros de Piratini – onde ela e Gomeri, hoje com 68 anos, dividiam casa na Rua Sete de Setembro, 721, centro.
O profissional e o pessoal
O repórter da Rádio Nativa e editor do blog Eu Falei, Nael Luis dos Santos Rosa, de 44 anos, foi o primeiro profissional de imprensa a chegar ao local do desastre. Alertado em casa por um vizinho, pegou seu equipamento fotográfico e partiu às pressas.
– De longe, vi que era sério. O Cherry havia batido numa mureta de pedra na entrada da ponte. O motor “entrou” no carro e prensou a condutora.
[caption id="attachment_254105" align="aligncenter" width="580" caption="O motor entrou no carro "]
[caption id="attachment_254117" align="aligncenter" width="580" caption="Vigas da ponte estão enferrujadas e tortas "]



O produtor rural reclama também do limite de tonelagem imposto pelo Daer.
– A determinação de que só caminhões com até 24 toneladas podem passar é uma prevenção exagerada, pois a ponte suporta mais peso. Na prática todo caminhão passa por ela com uma média de 50 toneladas. A ponte aguenta, mesmo assim a Polícia Rodoviária multa os motoristas. Mas nós seguimos passando com excesso de carga porque, apesar de tudo, é a melhor alternativa de tráfego. E porque aquela restrição de tonelagem, caso fosse seguida, inviabilizaria qualquer negócio.
O Daer reduziu a tonelagem porque a ponte, em vários acidentes, foi afetada por impactos de caminhões e veículos de passeio que abalaram a estrutura e aumentaram a distância dos vãos naturais de movimentação da ponte previstos no projeto original.
Uma espera de 30 anos
Lideranças empresariais e políticas de Piratini buscam uma solução há décadas, pressionando autoridades do governo do estado com visitas de delegações.
– Quando foi construída, há mais de meio século, a ponte foi um marco de desenvolvimento. Há cerca de 30 anos, porém, ela se tornou um
gargalo – afirma o empresário Maico Tunes Joanel, presidente da Associação Comercial até 31 de maio deste ano.
Segundo Maico, o último político que ensaiou uma solução – a construção de uma segunda ponte – foi o então governador Jair Soares (PDS). Ele construiu a rodovia RS-702, preparou as cabeceiras da nova ponte, mas, desde 1985, não se deu sequência à ponte nova.
O agrônomo Gomeri se emociona ao rememorar o ocorrido. Verte lágrimas. No momento da entrevista para esta reportagem, ele se recupera, em cadeira de rodas, da fratura de vértebras após cair de um barranco. E faz um pedido:
– Gostaria que as autoridades dessem atenção a essa ponte, senão as mortes vão continuar. Vi várias pessoas morrerem ali. No meu trabalho, visito muitas lavouras, viajo bastante. Uma vez, o motorista de um caminhão carregado de sorgo perdeu os freios e bateu na ponte. O homem estava esmagado na lataria. Gritava por socorro. Mas a gente não pôde fazer nada. Depois soubemos que ele iria se casar na outra semana. Isso machuca muito.
Ele lembra do momento em que sentiu que perderia a companheira:
– Quando estava abraçado à Fran no carro batido e o socorro não havia chegado, eu pedia a Deus que me levasse no lugar dela. Ela era nova; eu sou velho.
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